06/04/2020
Estratégia dos gestores, transparência parcial, fiscalização burocrática e falta de liquidez são as causas das perdas nas carteiras conservadoras

Ao conferir o desempenho das aplicações no mês de março, muitos investidores irão constatar que tiveram perdas nas posições em fundos DI. A explicação está relacionada com quatro fatores.
O primeiro deles foi a estratégia adotada pelos gestores de fundos conservadores. Para não perder receitas com a taxa de administração, houve um estímulo para a mudança do perfil da carteira dos fundos DI.
Em vez de manter as aplicações em títulos de baixo risco emitidos pelo Tesouro Nacional, a decisão de alguns administradores foi de investir parcela maior nos títulos de crédito privado. Esses papéis possuem remuneração mais elevada do que os títulos públicos.
A lógica dos gestores é que com a queda da taxa Selic, ficou inviável oferecer aos clientes fundos conservadores com taxas de administração acima de 1,5% ao ano. Por exemplo, se a taxa básica de juros é de 4,5% ao ano, como passou a vigorar entre dezembro de 2019 e fevereiro de 2020, as despesas administrativas do fundo consomem cerca de um terço da remuneração do investidor.
Para contornar esse problema, os gestores passaram a investir em títulos de crédito privado. A regulamentação dos fundos DI estabelece que 80% da carteira deve obrigatoriamente ser aplicada em títulos públicos ou papéis privados de baixo risco.
Ao comprar CDBs de bancos de primeira linha e debêntures de emissão pública, os fundos DI podem se enquadrar nessa disposição. E parte da remuneração adicional dos títulos privados pode ser canalizada para a taxa de administração.
O segundo fator é a transparência parcial para os investidores. Os materiais de venda e as lâminas de informações essenciais dos fundos DI classificam os fundos como de nível 1, o mais baixo risco.
A explicação mais detalhada de que o gestor da carteira adota uma política de investimento ativa na escolha das melhores oportunidades no mercado de títulos de crédito privado é omitida.
A consequência desta postura leva ao terceiro fator relacionado com a queda da rentabilidade dos fundos DI. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) adota uma fiscalização burocrática.
Para a autarquia, basta que o administrador da carteira cumpra as determinações legais para que o fundo seja considerado regular. Essa postura pode estar relacionada ao crescimento acelerado do mercado de capitais brasileiro, que acabou deixando a CVM defasada.
E, por último, mas não menos importante, o quarto fator foi a turbulência no mercado causado pela pandemia do coronavírus. Especificamente no segmento de crédito privado, houve uma paralisação dos negócios. Os investidores em títulos privados se retraíram e, ao mesmo tempo, os emissores adiaram novas ofertas.
Entretanto, a crise também gerou uma necessidade de caixa para os investidores em fundos DI. No mês de março, os resgates foram de R$ 16 bilhões nos fundos acompanhados no guia de fundos do Valor Investe.
Para fazer frente aos resgates, os gestores tiveram que vender os papéis da carteira. Além dos títulos públicos, precisaram também vender parcela das posições em crédito privado.
Isso provocou a desvalorização dos títulos privados e a queda na rentabilidade dos fundos. Se o mercado estivesse funcionando normalmente, os fundos não teriam dificuldade para se desfazer de suas posições.
Caso não encontrassem compradores no mercado secundário, os fundos poderiam se socorrer junto às instituições financeiras. Entretanto, no momento no momento atual, os bancos têm evitando os títulos privado.
No atual momento os bancos precisam de caixa para suprir as esperadas demandas por novos empréstimos de seus clientes. Além disso, ao comprar um papel privado, a instituição financeira precisa provisionar reservas, o que dificulta a alavancagem de novos negócios.
A queda de rentabilidade dos fundos DI foi provocada pela desvalorização dos títulos de crédito privado. Carteiras concentradas em LFTs e demais títulos públicos passaram sem arranhões por essa crise.
Fonte: Valor Investe